Inteligência Artificial: 3 finalistas, 3 perguntas
Da esquerda para a direita: Dovydas Matuliauskas (vencedor do FWL Lituânia), Alessandro Grillini (vencedor do FWL Groningen, Holanda) e Julius Upmeier zu Belzen (vencedor do FWL Adlershof, Alemanha) vão participar da final global do Falling Walls Lab, no dia 8 de novembro em Berlim. Os candidatos falam sobre a importância de seu campo de pesquisa.
Falling Walls: Quando você decidiu dedicar sua carreira de pesquisa à inteligência artificial e por quê?
Dovydas: Eu me tornei particularmente interessado na área de inteligência artificial aplicada à medicina quando eu estava no terceiro ano da faculdade (atualmente estou no quarto ano). Eu lia artigos a respeito e depois fui cofundador de uma start-up chamada Ligence.
Nossa equipe está desenvolvendo algoritmos de aprendizado de máquina (machine learning) para ajudar os médicos com exames de ultrassom cardíacos. Eu acho esse campo interessante porque ele ainda é muito novo e relativamente inexplorado, e creio que ele trará inúmeros benefícios ao setor da saúde em um futuro muito próximo.
Alessandro: O primeiro contato que eu tive com a inteligência artificial foi lá em 2008 ou 2009. Meu projeto de formatura no colegial era uma máquina de vetores de suporte, projetada para reconhecer sinalização rodoviária e permitir a implementação de um limitador de velocidade. Eu programo desde os 14 ou 15 anos e eu amo tudo que tem a ver com números, mas meus principais interesses de pesquisa acabaram por ser os mecanismos neurais subjacentes à percepção visual e ao movimento ocular.
Eu dei uma segurada na inteligência artificial por mais ou menos sete anos, até 2016, quando eu comecei a desenvolver um teste que vinculava as propriedades do movimento ocular a doenças neurodegenerativas. Como eu estava lidando com uma grande quantidade de dados e modelos complexos não-lineares, a inteligência artificial pareceu ser a resposta mais natural para o meu problema. Eu não sou um especialista nesse campo, de forma alguma, mas sou um aprendiz entusiasta e gosto de me manter atualizado.
Julius: Em 2017, eu estava na equipe de Heidelberg para a competição internacional de máquinas com design genético (iGEM) e trabalhava no nosso projeto de software. Nós fizemos uma rede neural que predizia com fidelidade a função de uma proteína, baseando-se na sua sequência de aminoácidos.
Por curiosidade, eu comecei a investigar o que era que a rede focava, e como aquilo se relacionava com propriedades importantes das proteínas — e eu descobri conexões surpreendentes. No fim das contas, demonstramos que essas análises podem ser utilizadas para saber melhor em que pontos as proteínas se ligam a outras moléculas, onde são cataliticamente ativas, dentre outras coisas. Essa ideia, que nós podemos aprender algo com nossos algoritmos de aprendizado, é tão fascinante para mim que é nisso que estou trabalhando.
Falling Walls: No seu ponto de vista, qual é o papel que a inteligência artificial terá na nossa sociedade?
Dovydas: Estou mais atento para a inteligência artificial voltada para a medicina, onde, na minha opinião, ela será uma assistente indispensável na prática médica cotidiana. Já existem muitos novos produtos entrando no mercado, que visam a nos ajudar a lidar com o problema da insuficiência do contingente laboral no setor da saúde, bem como com a exaustão de seus profissionais. Esses produtos permitirão um aumento na taxa de atendimento aos pacientes e tornarão, em última instância, a medicina mais acessível.
Alessandro: Acho que a inteligência artificial terá um vasto papel em nossa sociedade. Mesmo hoje em dia a inteligência artificial está na base de muitas coisas, o que a maioria das pessoas jamais suspeitaria. Apesar disso, a inteligência artificial em si mesma pode ser tanto uma grande aliada ou um grande perigo para a sociedade de amanhã: a necessidade de uma regulação clara sobre o desenvolvimento e aplicação da inteligência artificial é de suma importância, hoje mais que nunca.
Essa regulação terá que levar em conta tanto aspectos tecnológicos quanto éticos, se desejamos prosperar com a inteligência artificial e não padecer sob sua inevitável onipresença. Em geral, eu me considero um otimista cauteloso e acredito que a inteligência artificial será pré-condição para uma aceleração sem precedentes do progresso humano.
Julius: No futuro próximo, acho que a IA vai nos ajudar aumentando a qualidade de muitas pequenas tarefas. Os algoritmos de aprendizado vão se ocupar de muitos afazeres que nós consideramos tediosos e repetitivos — eu acredito e torço para isso.
No melhor cenário, nós poderemos empregar o tempo que ganharmos por meio disso para nos dedicar a coisas mais interessantes e criativas, quem sabe, até trabalhar menos. Isso sem dúvida transformará nossa sociedade. Para que essa seja uma mudança para o bem de todos, é necessário que suplementemos os avanços técnicos com avanços éticos, políticos, econômicos e sociais.
Falling Walls: Quais são as barreiras que a inteligência artificial vai derrubar na ciência e na sociedade nos próximos vinte anos?
Dovydas: Acredito que os resultados mais nítidos serão na admissão de pacientes e na redução da carga de trabalho. Hoje, os pacientes formam filas e os exames de imagem formam pilhas nos hospitais de toda a Europa. Esses problemas vão ser atacados com rapidez com o advento da inteligência artificial. Eu me atrevo a pensar que a inteligência artificial poderá também ajudar no diagnóstico e no tratamento, se construirmos uma base de dados médica grande o suficiente para ensinar redes neurais.
Se esses problemas forem sanados, os profissionais da saúde poderão passar mais tempo com seus pacientes e fazer mais trabalho científico. É como ter uma máquina de lavar louça. Quanto tempo a gente gastava lavando louça antes de elas existirem? Agora podemos focar em coisas mais interessantes. O mesmo vale para a medicina.
Alessandro: Sou suspeito para dizer isso, mas tenho quase certeza que barreiras serão derrubadas na área da saúde e medicina. Elas são um terreno fértil para a aplicação de inteligência artificial: uma quantidade enorme de dados médicos é produzida diariamente, e o que os médicos tentam responder geralmente é das duas uma: “A qual doença correspondem esses sintomas?” e “Como a doença vai se desenvolver com o tempo?”
Diagnóstico (classificação) e prognóstico (previsão) são duas tarefas nas quais a inteligência artificial sem dúvida leva vantagem. Esperamos que isso leve a um sistema de saúde melhor, em termos gerais, isto é, menos caro e mais igualitário.
Julius: A primeira coisa que me veio à mente são as barreiras linguísticas. Estamos a um passo de desenvolver ferramentas que permitem conversas interlinguísticas em tempo real. Isso terá um potencial enorme de colocar pessoas com todo o tipo de origem em contato, de aproximar pessoas de todo o mundo. Um dos desafios científicos mais interessantes, do meu ponto de vista, é a previsão de quais são as consequências a nível de organismo quando são feitas alterações no genoma de um indivíduo. Para chegarmos a esse ponto, seria preciso vencer muitos graus de complexidade, desde as moléculas individuais de DNA até as células, tecidos e órgãos, incluindo interações entre elas e com seus respectivos contextos. Mas, se é que isso é possível, eu consigo imaginar que veremos isso nos próximos vinte anos. É claro que será ainda melhor se a IA não só nos der previsões, mas também puder ser usada para explicar quais fatores são fundamentalmente responsáveis pelos efeitos que observamos e prevemos.
Fonte: Falling Walls Fragments